segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

A VAGINA FUMANTE (de Bosco Silva)



Após o quarto ecstasy, Paula foi ao banheiro da boate. Arriou as calças e sentou-se no vaso sanitário; acendeu um cigarro e ficou a olhar as paredes cobertas de frases obscenas. Uma lhe causou risos incontidos:

“Para curar um amor platônico só mesmo uma foda homérica.”

Tragou mas uma vez o cigarro enquanto ouvia o cair de sua urina na privada, embalada pelo som enervante da música eletrônica que vinha da pista de dança. De repente, enquanto soltava mais uma baforada de fumaça, ouviu uma voz feminina, “hei, hei, você ai”. Paula olhou para os lados, e não viu nenhuma janela e muito menos alguém por perto. Por um momento, pensou que seus sentidos tinham-lhe enganado; e assim voltou a tragar o cigarro novamente enquanto examinava o esmalte das unhas. Mas a voz novamente fez-se ouvir, “hei, você ai”. Paula olhou em direção a porta do banheiro e, com a voz firme, disse: “O que é? Não está vendo? Está ocupado. Aguarde sua vez”. A voz então lhe respondeu: “Eu não estou à porta. Estou aqui, aqui embaixo”. Paula olhou então para o piso do banheiro, imaginando a existência de esgoto ou de algo parecido em que pudesse caber alguém. Até que um assovio fez-se ouvir do fundo da latrina, acompanhado de um “hei, estou aqui embaixo de você”. Ela então olhou dessa vez para o fundo do vaso sanitário, e não acreditou no que via: sua vagina se movia como uma boca que expelia frases sonoras. Paula levantou-se assustada deixando suas calças descerem até seus pés.
- Um trago, desejo um trago – disse sua vagina.
- O que está acontecendo comigo? – disse Paula consigo mesma, passando as mãos sobre o rosto e olhando, atordoada, sua genitália.
- Vamos, rápido – continuou a vagina.
- O que você quer?
- Já disse: um trago – respondeu a vagina impaciente.
- Não acredito que estou conversando com minha própria vagina!
E com a insistência da mesma, Paula acendeu um cigarro e levou até sua vagina. E esta tragou com voracidade.
- Sabe, nunca gostei do termo vagina, prefiro xoxota – disse a própria, tragando o cigarro, e soltando a fumaça, como as vaginas daquelas praticantes de pompoarismo da Tailândia. – É bem mais carinhoso. E, além disso, você sabe, nenhum namorado seu me chamou, naquelas horas, de vagina; sempre foi "deixa eu ver, meu amor, essa buceta... essa perseguida... essa xoxota". Lembro que um me chamava de moqueca.
- O Marcos.
- Que Marcos? O Salvatore?
- Sim. Ele era tão carinhoso e engraçado.
- Mas havia aquele outro, aquele engraçadinho que me chamava de pata de camelo.
- Ah, o Teco.
- Mas pior que ser chamada de vagina, era quando aquele outro sujeito me chamava de vulva, que nome feio.
- Ah, esse era o Haroldo, o Brandão. Ele era tão metódico; mas o que esperar de um psicólogo, né?
- Pois é, então porque me chamar de vagina. Vagina é dito quando alguém não quer ter intimidade, como um ginecologista, mas eu sou íntima de você, por isso me chame de xoxota, meu bem.
- Mas eu sei como você ficou na minha última visita ao ginecologista, sua danadinha.
- Também pudera com aquele homem lindo. Fiquei toda molhadinha!
- E se fosse uma fantasia – argumentou Paula, sentada novamente, com as calças arriadas na latrina, dividindo o cigarro com sua vagina -, digamos que alguém me pedisse para irmos às vias de fato, fantasiando ser um ginecologista?
- Bem, toda regra tem exceções, minha querida.
- Ahã!, te peguei agora sua safadinha – disse Paula dando leves palmadas em sua vagina.
- Tudo bem, tudo bem, eu me rendo, mas não faça como aquela vez em que encontraste outra xana pra se esfregar.
- Foi mais uma experiência. E que tal? Você não gostou?
- Bem, sabe quando você quer calabresa mas lhe dão salsicha?
- Ahã.
- Foi assim que eu me senti: não me contentei com dedos, querida. Falando nisso, não estamos esquecendo de algo?
- Maurício! – exclamou Paula levantando-se e vestindo rapidamente as calças.
- Ele parece ser tão bem dotado! – comentou a vagina satisfeita.
- Não me admira que não se contenha com salsichas, larga como estás, sobra espaço – comentou uma voz grave.
- Quem disse isso? – inqueriu Paula, assustada, antes de abrir a porta do banheiro.
- É ele – respondeu a vagina.
- Ele quem?
- O seu cu.
- Ele também fala?!
- Bem, ouço mais do que falo, mas dou meus palpites também, querida – disse o cu de Paula.
- Vamos, vamos, meu bem, não ligue para as opiniões de alguém que nunca lhe encarará de frente – comentou a vagina enquanto Paula abria a porta e seguia enfrente.
- O que você sente é inveja, já que no final eles sempre acabam procurando por mim – retrucou o cu a vagina, enquanto esta lhe mostrava a língua, ou algo parecido.
- Ah é? Eu juro que irei atrapalhar da melhor forma possível: merda – disse o cu irritado, enquanto Paula seguia para mais um encontro amoroso, sendo imediatamente interrompida, e retornando ao banheiro, mas desta vez por outros motivos.
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